sexta-feira, 13 de abril de 2007

EM CASA

Muito embora algumas figuras fossem novas, outras já ali estiveram, a chamado meu, para compartilharem meus anseios, minhas duvidas e minha tristeza. Assim, ainda na dúvida passei a buscar em meu quarto a razão de minha existência, de minha vida, de minha morte e, pior, como seria minha morte. Ao meu lado, uma pequena mesa redonda, de carvalho muito velho, carregava alguns livros; em minha frente a cama, minha única companheira que ainda não se via arrumada e, já fazia mais de três dias que ninguém se importava com ela, deixando-a com os lençóis amarrotados e já quase com a marca de meu corpo fixado ali definitivamente. A parede do lado direito, que se opunha à janela, levava em seu meio um quadro de um certo pintor famoso, que já não lembro o nome, pintado por uma amiga de infância a contra-gosto e, entregue a mim da mesma forma. A mesa que se postava quase que ao lado da cama estava abarrotada de papeis sendo uns escritos outros não, mas, eram tantos que faziam pilhas e mais pilhas. Podia-se se ver ainda alguns jornais que ali estavam há semanas, já lidos e relidos, com suas noticias ultrapassadas, mas completamente atuais face ao momento onde, para arrepio meu, pode-se notar que sempre era repetido. E a luz, oriunda de uma lâmpada mal colocada estrategicamente no quarto não brigava comigo eis que, eram raras as vezes que eu a acendia, incomodando-a. A pintura do quarto era, como a de toda a casa, de uma cor sempre intrigante, pois, os antigos donos talvez por saberem que iam vendê-la fizeram questão de dar-lhe uma cor a título de vingança pelos cruéis momentos que por ali passaram. Eu, por minha vez, até gosto da casa, como gosto do meu quarto e das coisas que ali estão. Quanto à pintura tenho minhas duvidas. Ainda na cadeira, ao lado de minhas imagens, podia ver minhas roupas, de cores taciturnas, como meu espírito. Dizem alguns que as roupas refletem o íntimo de seus donos e, fosse verdade isso, devia eu estar então já ao lado de meus antepassados, em uma cova, pois, procurava sempre me vestir com roupas pesadas, de cor marrom ou preta e, de preferência envelhecida pelo uso do guarda-roupa. Nunca me prestei a usar, imediatamente, qualquer roupa que comprasse. A deixava por algum tempo guardada como que para se acostumar com o local, e, depois comigo. Ai então a vestia e, se gostava muito dela fazia com que não voltasse logo para seu lugar, a vestindo por dias seguidos, o que, de uma certa forma, trazia um certo mal estar para aquelas poucas pessoas que vinham me ver ou que encontrava na rua, quando saia de casa. Minhas botas estavam há muito precisando de cuidados e, era o que mais gostava uma vez que vestiam muito bem o dono, de forma confortável. Uma cadeira se contrapunha ao sofá de pano amarelo onde me encontrava. Não uma cadeira qualquer, mas, escolhida a dedo e com critério rigoroso. Era, como o sofá, bastante cômoda, de madeira de carvalho como a pequena mesa ao meu lado, integrando o ambiente lúdico. Assim, já incomodado pela fome e sede dei uma rápida olhadela por todo o quarto, cujo piso de tabua corrida sem cera, resmungava sempre que por ali passava, passei as mãos pelos braços do sofá, agradecendo-o pela hospitalidade e, mesmo no escuro, fechei a janela a fim de dispensar as imagens que ali estavam a me visitar. Sem tatear dirigi-me à porta, levando comigo as questões possíveis e que poderiam ser discutidas com o estranho que estava a me procurar...

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